ARQUIVO
Notícias
 

Acta Jornadas de Teatro 2017
há 356 semanas

 

ATA DAS JORNADAS DE TEATRO 2017

 

Ata é uma árvore que dá frutos, é o registo de uma sessão coletiva, é a forma imperativa que manda unir dois fios que estavam separados.

Esta ata ata palavras que foram ditas nas Jornadas de Teatro 2017.

Nas Jornadas falou-se do financiamento às artes, dos cachecóis dos artistas, esses perigosos viciados em financiamento que contam hits de Facebook para somar pontinhos na candidatura, onde se falou do artista-gestor, variante estética do Médico e do Monstro, entre os quais é preciso distribuir percentagens e distribuir horas de atenção.

Nas Jornadas falou-se na burocratização das plataformas e dos artistas que se contratam a si próprios e são dos piores patrões que há. E que ser ator não é só estar no tablado, na crinolina ou no set, mas também saber de recibos e direitos e deveres e contratos de trabalho de curto prazo.

Falou-se dos recibos verdes, placebo de toda uma classe profissional e se perguntou quem arcava com o risco de uma arte que inquieta um país, onde se falou de artistas que mandam tudo para o galheiro pela arte, e às vezes até se mandam a si próprios.

E se perguntou repetidamente pela ata, a tal que nos desatasse.

Descobriu-se que há quem ande a emergir desde 2001, a emergir sem água, a emergir de porra nenhuma. Que há quem não possa estar nas Jornadas por ter trabalho, por ter de ir para Paredes de Coura emergir. Ou que traga o trabalho para as jornadas, como se o trabalho artístico fosse uma criança hiperativa que não pode ficar sozinha em casa.

E descobriu-se que emergir é não querer estar num sistema estético, ou ter uma estética do lixo, ou uma estética de resistência. Que para ser emergente é preciso ser bartender, ou organizar sardinhadas para 8000 pessoas, ou fazer arte nos buracos do segundo ou do primeiro emprego. E que há quem não chegue a emergente por não ser suficientemente importante para isso, por não a estética certa. Que ser emergente é estar preparado para começar ou recomeçar. Que é acabar a salada de frutas estéticas da escola artística para passar o resto do tempo a tentar encontrar a própria estética, a da sobrevivência.

Concluiu-se com o acesso e a circulação das artes performativas, e concluiu-se que há dois Portugais: o dos teatros municipais e o dos teatros independentes; que há dois criadores: o artista e o programador; que há o lugar onde ficam os criadores fora de Porto e de Lisboa, para quem o preço das portagens ainda é demasiado pesado. Concluiu-se que é preciso pagar a quem vem do estrangeiro, mas não é preciso pagar a quem vem da província, que é até um favor que se faz.

Concluiu-se que importa ser pluri-multi-trans-afro-euro-inter e fazer tudo menos o projeto artístico para obter o apoio. Que importa ser jeitoso em tudo para não se ser realmente bom em quase nada.

Concluiu-se que um programador pode ser um parceiro, um divulgador, alguém a quem pesam os e-mails por responder e os espectáculos por ver. Concluiu-se que criar é um investimento enorme, no cérebro e na carteira, e que só queremos que as criações vivam tanto quanto possível, seja cá, seja lá, seja sem sair do sítio, mesmo quando as criações estão um bocadinho à mercê dos presidentes de câmara.

Falou-se de que havia espaço para toda a gente e que o problema era mesmo como abrir as portas à multidão.

Como ter liberdade sem orçamento.

Um ato é uma parte de uma peça de teatro, é uma fórmula religiosa, é um movimento, é uma ação. E nesta ata registam-se os atos que se decidiu fazer:

Vamos dar mais crédito ao trabalho e às obras artísticas pelos nossos pares, pelo público e pelas instituições.

Vamos reivindicar 1% para a cultura.

Vamos exigir que a soma da inflação desde os cortes de 2009 seja reintroduzida nos apoios.

Vamos criar um Manual de Boas Práticas sobre a lei laboral no setor.

Vamos, nós, as estruturas, dar melhores condições de trabalho aos trabalhadores.

Vamos, nós, as estruturas, dar melhores condições de trabalho a nós próprios.

Vamos acabar com o trabalho não remunerado nas artes performativas.

Vamos criar tabelas de remuneração a nível nacional.

Vamos fazer tabelas salariais e sessões de esclarecimento, para que se acabe com as confusões.

Vamos sugerir ao CENA/STE que se criem tabelas salariais de referência.

Vamos acabar com os falsos recibos verdes, os falsos estágios, os falsos intermitentes.

Vamos lembrar ao governo que já foram ultrapassados os prazos apontados para se criar um novo regime de contribuições para a Segurança Social.

Vamos combater a precariedade em geral, e não apenas nas artes.

Vamos comunicar mais entre nós sobre aquilo que cada um faz e as dificuldades que todos temos.

Vamos trabalhar para construir uma lei de bases do trabalho artístico;

Vamos promover mais formas de entendimento entre os agentes e o Estado.

Vamos criar uma Rede Nacional de Teatros, à imagem das redes de bibliotecas e de museus, para promover a criação artística e o florescer dos públicos.

Vamos descobrir porque é que a rede de Bibliotecas Municipais funciona bem e tentar fazer o mesmo na rede de cine-teatros.

Vamos pedir à DGArtes uma base de dados completa do panorama artístico português, incluindo programadores, produtores, festivais, estruturas, etc., etc.

Vamos exigir uma lista de todos os espaços de apresentação e produção do país, com os seus contactos e as suas características.

Vamos pedir ao Ministério da Cultura que se criem equipas para gerir os espaços mais pequenos que já existem.

Vamos exigir mais salas de ensaio e de apresentação para as companhias independentes.

Vamos reivindicar que a RTP seja também casa e palco das artes.

Vamos reforçar os programas curriculares para tornar os alunos de artes mais autónomos quando entram no mundo do trabalho.

Vamos organizar encontros entre associações para incentivar as boas práticas e acabar com o isolamento.

Vamos exigir que se apoie a itinerância da criação, como acontece no modelo do Território Artes.

Não vamos municipalizar o apoio às artes.

Vamos, isso sim, profissionalizar o apoio à criação a nível local, na gestão e na produção, para que as linhas programáticas se tornem coerentes;

Vamos defender o valor incomensurável das artes performativas.

Vamos proteger um teatro de diversidade num mundo que é cada vez mais diverso.

Vamos fazer uma proposta quando conhecermos a proposta que o ministério vai apresentar;

Vamos marcar novos encontros, em cada região, quando se souber mais sobre a nova legislação dos apoios às artes, para que possamos pensar sobre a nossa área.

Vamos continuar o trabalho conjunto entre as associações e o sindicato das artes performativas para dar força e representatividade ao setor.

Vamos criar já no final destas jornadas grupos de trabalho para dar continuidade às discussões do "Trocando-peças".

Vamos procurar, dentro das nossas estruturas, e apesar das adversidades, alegrarmo-nos com cada conquista que conseguirmos.