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OE 2018: E à terceira não foi de vez!
há 336 semanas

 

Posição do CENA-STE sobre o OE 2018 para a Cultura

 

O CENA-STE esperou pela audição dos Srs. Ministro e Secretário de Estado da Cultura, ontem, na Assembleia da República, para perceber se aí iriam surgir compromissos para que ainda se observem aumentos nas verbas destinadas à Cultura no Orçamento do Estado para 2018. Infelizmente, nada de novo. Assim, publicamos hoje a nossa posição sobre este OE18, com a certeza que não teremos um horizonte para a Cultura acima de zero.


E à terceira não foi de vez!

É factual, o Orçamento do Estado de 2018 prevê verbas para a Cultura totalmente afastadas daquilo que seria um sinal de aposta política séria no sector, nas suas estruturas e nos seus trabalhadores. Com este OE, mais uma vez, não vislumbramos sequer uma tentativa mínima de dar passos seguros, ainda que lentos, na direcção da meta de 1% para a Cultura.

O governo do PS dá assim seguimento às opções tomadas nos orçamento para 2016 e 2017, destinando à Cultura um papel de figuração no seu projecto político. 

 

O Ministério da Cultura anunciou o aumento global, 10,9%. Esmiuçando para já o número: destes, 10% dizem respeito à RTP (Comunicação), deixando apenas um aumento de 0,9% para a Cultura

 

Mas é preciso ir mais fundo na análise para perceber o quase nada que esta percentagem representa, e o nada que ela vai significar para a esmagadora maioria de trabalhadores e de estruturas de criação e produção, tanto estatais como independentes. 

 

De uma forma global, uma parte significativa deste aumento, vem do aumento de receitas próprias - p.e., venda de bilhetes e receitas do jogo. Apenas na vertente de apoio a projectos há um aumento do investimento público no sector. 

 

Nas artes performativas, temos um aumento de cerca de 4 milhões para a DGArtes. Valorizamos este facto, mas não podemos esconder que mais uma vez este número desilude. Serão cerca de 17.5 milhões de euros - 15 dos quais destinados aos concursos de apoio plurianuais recentemente abertos para as diferentes áreas artísticas - ainda abaixo dos valores com que a DGArtes contava em 2009, antes dos primeiros cortes. 

 

E se olharmos para as verbas plurianual destinadas a estes apoios - orçamentação plurianual que foi uma vitória do sector no Novo Modelo de Apoio às Artes -, verificamos que também os anos de 2019, 2020 e 2021, irão ficar abaixo desses valores de 2009 - 16.5 milhões para os apoios plurianuais. 

 

No cinema e audiovisual, continuamos a afirmar que as verbas disponíveis no ICA para o apoio a está área, deveriam vir directamente do Orçamento do Estado e não de uma taxa consignada que, por decisão de terceiros, pode não ser paga ou o seu pagamento ser protelado, como já aconteceu. E entendendo que aqueles a quem é cobrada esta taxa devem contribuir para o desenvolvimento das produções que sustentam o seu negócio, nada impede que o governo decida começar a acrescentar a esse valor investimento estatal. Teríamos assim a possibilidade de, por exemplo, deixar de financiar uma longa metragem com valores idênticos aos de há 15 anos, criando condições objectivamente melhores para garantir mais direitos laborais e limitar menos as opções artísticas e técnicas das produções. 

 

Para as entidades estatais de criação e para os seus trabalhadores, também as notícias não são boas, serão até as piores. 

 

A Cinemateca tem um aumento insuficiente (300 mil euros) para melhor cumprir a sua função. Para, por exemplo, voltar a apresentar todos os filmes com legendas em português.

 

Os teatros nacionais D.Maria II e São João estagnam, com um aumento de 100 mil euros e 200 mil euros, respectivamente, que deverá ter apenas em conta o anunciado descongelamento de salários e carreiras dos trabalhadores da Administração Pública. Não só este parco aumento é gravoso para o funcionamento interno destes teatros e para o cumprimento do seu papel, como também o esforço das estruturas independentes se mantém. 

 

No D.Maria, por exemplo, é hoje necessário que essas estruturas assegurem pelo menos 40% do orçamento da produção que levarão a cena neste teatro, sendo que muito frequentemente se tratam de estruturas sem apoio plurianual. Ou seja, estas co-produções, na realidade, são perversas financeiramente, pois recai sobre a estrutura independente um grande peso financeiro, apenas colmatado pela descida acentuada dos salários dos artistas envolvidos, normalmente a falso recibo verde.

 

No Centro Cultural de Belém há um corte de cerca de 1,4 milhões de euros, que deixa antever uma diminuição de custos com produção de espectáculos nesta Fundação. Aqui, cerca de 400 mil euros de corte estão relacionados com a externalização dos serviços de restauração e catering, ou seja, menos custos com trabalhadores. Mas estes serviços continuam a existir no CCB, portanto resta saber quanto gasta agora o CCB com eles e em que condições contratuais se encontram os trabalhadores da empresa agora responsável pelo serviço. Observa-se já uma degradação do serviço, o bar dos artistas, que garantia a todos os trabalhadores da casa acesso a refeições normais, foi substituído por máquinas distribuidoras.

 

No OPART, E.P.E., entidade que gere o Teatro Nacional São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado, há um surpreendente corte de cerca de 2,3 milhões de euros, ainda mais surpreendente é perceber que metade deste valor, cerca de 1,1 milhões, são cortes na despesa com pessoal.

Fazendo contas de cabeça à necessidade extrema de reforçar as equipas técnicas do São Carlos e do Teatro Camões, de integrar nos quadros os trabalhadores com vínculos precários que desempenham neste momento funções permanentes e indispensáveis, de ter em conta o descongelamento de salários e carreiras e corrigir várias situações laborais, que devido aos constrangimentos financeiros impostos à estrutura criaram injustiças tremendas para um conjunto significativo de trabalhadores, surge a questão: como será possível reduzir custos com pessoal no OPART?

Haverá despedimentos? Serão propostas reformas antecipadas? Pensam o Ministério da Cultura e o Ministério das Finanças impedir a regularização de situações de precariedade nesta empresa? Não terão estes trabalhadores os seus salários e carreiras descongelados já em Janeiro de 2018? 

 

E no meio de tudo isto, está contemplado para o Fundo de Fomento Cultural um aumento de mais de 2 milhões de euros, aumentando assim os montantes de um fundo que, como temos vindo a chamar à atenção, tem critérios de atribuição bastante opacos e difíceis de escrutinar.

 

Fora das verbas destinadas à Cultura, valorizamos uma conquista que sempre fez parte das reivindicações sindicais, a descida do IVA dos instrumentos musicais de 23% para 13%. Sendo uma medida de grande importância, ele está ainda a meio do ideal, a descida para os 6%.

 

António Costa disse que, se fosse deputado, aprovaria as propostas na especialidade que aumentassem as verbas da Cultura. Ou António Costa, no papel de Primeiro-Ministro, se ausentou da elaboração do OE na altura da discussão das verbas para a Cultura, ou estas declarações são tão vazias quanto as promessas feitas ao sector aquando da campanha eleitoral para as últimas Legislativas.

 

Em conclusão.

Mais uma oportunidade se perde, de eliminar o zero vírgula quê? que não permite à Cultura garantir direitos laborais para os seus trabalhadores, potenciar e ver nascer novos projectos artísticos, criar mais postos de trabalho, melhor contribuir para o desenvolvimento artístico, cultural e social do país.

A Cultura acima de zero só será uma realidade quando existir um governo que entenda o papel que deve ser destinado ao sector. Até lá, cabe a todos nós, técnicos, artistas, criadores, produtores, programadores, entidades de criação e produção, organizações representativas, públicos, exigir com cada vez mais convicção o limite mínimo do 1% para a Cultura. E teremos, todos, que aproveitar todos os momentos para levar esta luta até ao fim.